quarta-feira, 6 de março de 2013

O canto em Cy, por Aquiles Reis

As meninas do Cy (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, coleção Aplauso), é o livro no qual Inahiá Castro revela a biografia do Quarteto em Cy. Emocionado, agradeço a ela, que, plena de emoção e competência, trouxe à luz o percurso cinquentão das Cys.

Ao agradecê-la, estendo minha homenagem a todos os memorialistas que se dedicam a pesquisas musicais para fazerem dos que somos fãs personagens de um enredo que quase sempre parece inspirado em um romance. A eles meu aplauso.

Logo no início do livro está o perfil dos pais das quatro meninas e o legado que ensinaram e deixaram para elas. E como assim se formou o caráter que as acompanhou à juventude e à maioridade. A saída do interior da Bahia, a chegada a Salvador. A ida para o Rio de Janeiro. O encontro fundamental com Vinícius de Morais. Sucesso. Viagens. As desavenças, os recomeços... a vida.

Está tudo lá nas 246 páginas de um livro bem encadernado e repleto de belas e marcantes fotos de arquivo. (Comentada por Igor Garcia, há também a discografia dos 38 trabalhos do Quarteto, bem como dos discos solos gravados por cada uma delas.)

Inahiá me faz viajar no tempo, quando, dentre outras situações, relembra as quatro voando para Los Angeles, Cyva casada com o Aloísio de Oliveira. Haja coragem! Fala das separações, das trocas de integrantes, tantas. Lembra quando Cynara e Cybele, sob vaias, cantaram “Sabiá” no Maracanãzinho, tendo ao lado Tom e Chico. Recorda quando Cynara gravou “Pronta Pra Consumo”, seu LP solo. Revê as dezenas de discos lançados, muitos com formações diferentes do Quarteto original e do atual.

Lembra também dos recomeços, tantos. Dos muitos shows, inclusive de um que muito me emocionou, “Resistindo”, direção de Benjamim Santos, encenado no Teatro Fonte da Saudade, no Rio de Janeiro. Lembra ainda de outro momento importante, dentre tantos outros, em que o Teatro Carlos Gomes foi todo reformado apenas para o show “Cobra de Vidro”.

Partindo de depoimentos, principalmente de Cyva e Cynara, mas também de inúmeras outras pessoas, Inahiá desvenda uma história de alegrias e tristezas, sucessos e ostracismo. Mas o jeito como os depoimentos de terceiros foram inseridos é o único senão do livro: colocados em meio ao desenrolar da trama, eles findam por quase quebrar a sequência dramática da narrativa, atenuando-a. E olha que o que não falta na vida do Quarteto em Cy são situações que beiram o drama. Aí reside sua beleza.

Inahiá descreve também a dificuldade que é manter unido um conjunto de pessoas, com os egos suplantando a união e propiciando a discórdia, e ensina: abrir mão de opiniões em favor de continuar trabalhando junto é um dos obstáculos que todo grupo enfrenta enquanto busca a longevidade.

Finda a leitura, eu me pergunto: depois das lembranças, o que resta? Restam os dias de quietude saudosa e da desconsolação? Ora bolas, tudo isso restará. Mas principalmente restará o canto, pois, para quem sempre viveu dele, ele será eterno.

Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4