segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Uma Presa na Teia

“Um filhote de leão, raio da manhã”

A pueril canção de Caetano Veloso, “O Leãozinho”, despertou no menino uma relação de projeção-identificação; muito pela figura imaginária do leão, representante de seu signo zodiacal, provido de juba, e especialmente pela imediata empatia criada entre o jovem e o mais leonino dos rebentos de Dona Canô e quiçá da Bahia. Mais de trinta anos após o início da Tropicália surgiu, com algum atraso, um grande atuante do movimento: eu. Em devaneios, sentia-me integrante da turma de Caetano, Gil, Gal, Mutantes e Tom Zé, imerso nas caixas de som conectadas ao recém-comprado toca-discos – aparato em desuso àquela década de 90 – que girava os primeiros LPs de minha coleção.

O continente original de "O Leãozinho": "Bicho", 1977, Philips.

“Eu, você, João girando na vitrola sem parar” (in “Saudosismo”)

Dez entre dez tropicalistas recomendavam João Gilberto. Foi o que descobri ao ler “Tropicália – A História de uma Revolução Musical”, o livro de Carlos Calado responsável pela minha traição ao movimento. Fui atrás de João Gilberto e deixei um pouco de lado a turma multicolorida para mergulhar no monocromatismo da Bossa Nova, bem representado pelas capas de César Gomes Vilella para a gravadora Elenco. Da junção da luz de todas as cores, surge o branco; dos pigmentos, o preto. É o que prega o design gráfico, e que se pode aplicar perfeitamente ao conceito de Bossa Nova. Uma sonoridade que é simples somente na aparência. Com uma percepção mais atenta, percebem-se os milhares de tons que a compõem.


“Outras notas vão entrar, mas a base é uma só” (in “Samba de Uma Nota Só”)

João puxa Tom, que puxa Vinícius, que puxa Caymmi, Carlos Lyra, Chico Buarque, Paulo César Pinheiro, Noel Rosa, Dolores Duran e meio mundo. Meio mundo que se encantou pela música brasileira, que puxou Stan Getz, Charlie Byrd, Dizzie Gilespie, Ella Fitzgerald, Frank Sinatra, Sting e muitas reticências. Mesmo a popstar Madonna é fã de Astrud Gilberto; Norah Jones tem como grande influência Maria Creuza.

Reticências puxam et ceteras e novas gerações. Com afinco e curiosidade comecei a perceber a arte musical como uma teia. Vasculhar esta teia virou obsessão. Percebi-me, assim, um explorador e um devoto da boa música.

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